18.7.10

A mídia e o caso Bruno

O jornalista Gustavo Poli, do portal globoesporte.com, em seguida à explosão do “Caso Bruno”, escreveu um longo artigo sobre o assunto. Defendeu, basicamente, dois pontos.
Primeiro. O crime brutal cometido pelo goleiro do Flamengo e seus asseclas foi o capitulo derradeiro de uma série de desvios perpetrados pelos atletas do clube em seguida ao hexacampeonato brasileiro do time. Sem culpa ou rubor, Poli colocou no mesmo balaio os excessos de Adriano, Vagner Love, a briga de Willians numa boate, com o provável assassinato da jovem Eliza Samúdio e o subseqüente desmembramento do seu corpo com seus restos sendo dados a cachorros. Para Poli, é tudo igual. O jornalista não vê nenhuma diferença entre a ação de um criminoso cruel e frio e os excessos condenáveis de jogadores que, frente ao sucesso e à idolatria, não conseguem ter a medida para um comportamento comedido, traço tão comum aos jovens, famosos ou não.
Nesse mesmo argumento, Poli faz a defesa da classe jornalística e da “função social” da mídia, uma auto-promoção que o jornalismo corporativo dos grandes grupos de comunicação adora fazer para nada mais do que limpar a própria barra. No seu texto, Gustavo relembra que a mídia foi atacada por uma parte do público ao denunciar os excessos dos atletas e que ela, a mídia, estava certa e que tais excessos levaram ao trágico fim de Eliza.
Aqui, seria ótimo discutir o papel da mídia e a relação custo benefício da divulgação dos escândalos cometidos por famosos. Primeiro, porém, seria bom discutir o conceito de celebridade, tão valioso nos dias de hoje.
Celebridade, nos dias de hoje, é alguém que chama a atenção do grande público por uma habilidade artística (atores, cantores, etc), esportiva (jogadores de futebol e atletas em geral), por protagonizar um fato de grande repercussão (BBBs, beldades instantâneas, namoradas de famosos, etc), ou ainda por diversos modos de destaque na sociedade.
O mercado das celebridades é vigoroso, com novos nomes surgindo a cada instante e pelos motivos mais diversos. Até os mais esdrúxulos, como a da estudante da UNIBAN, Geisy Andrade, expulsa de sala de aula por usar um vestido curto, ou o da dançarina exótica que se apresentou para o premier italiano Silvio Berlusconi. Com vida útil maior ou menor cada uma dessas celebridades lucra e sofre por sua exposição.
Voltando ao papel da mídia, está claro que celebridade gera dinheiro. A atração que o grande público tem por essas figuras aumenta a audiência das tvs, das rádios; as vendas e assinaturas de revistas e jornais; e os “page views” de sites e portais. Celebridade é produto nobre nos mercados da comunicação, do marketing e da propaganda. E o melhor nesse caso é que, quando se trata de celebridade, não interessa se a notícia é boa ou ruim, o interesse é o mesmo. Pode-se ate dizer que o interesse pelos fatos negativos é ainda maior do que pelos fatos positivos.
Voltando a Poli, e essa opinião é dominante entre jornalistas dos grandes grupos corporativos de comunicação, a veiculação de notícias sobre farras, brigas ou bebedeiras de jogadores de futebol nada mais é do que o cumprimento do dever jornalístico de noticiar o que é notícia. Uma ação nobre em defesa dos bons valores e costumes da sociedade. Não há, segundo ele, nenhum interesse comercial de noticiar porque é notícia que vende. Mas sabemos que há. E sabemos também que se notícia o que se pode noticiar. Sabemos que dependendo do personagem (como atores com contrato com a Rede Globo, por exemplo) em se tratando de notícias relacionadas a mal comportamento (como consumo de drogas, brigas de casal, etc) só são noticiados casos de extrema gravidade que não terão mesmo como serem abafados. Caso contrário, silêncio.
Seguindo na sua análise, Poli chega ao segundo argumento e utiliza o conceito de ídolo e acusa os atletas de não cumprirem seus papeis de ídolos para tantas crianças e jovens, que os tem como exemplos. Mas quem constrói tais ídolos? Quem toma jovens geralmente vindos de famílias pobres, sem a educação formal e a estrutura familiar adequadas para enfrentar as tentações da vida com equilíbrio e os transforma em ídolos mundiais? Quem joga sobre esses mesmos meninos a responsabilidade de educar crianças e jovens de todo o mundo? Quem exige desses meninos um comportamento exemplar, o mesmo comportamento que a sociedade em geral não tem? A resposta para todas as perguntas acima é uma só: a mídia.
Em cada manchete, em cada matéria no Fantástico, em cada entrevista exclusiva falando da vida pessoal do atleta, acontece a construção do ídolo. E ídolos são necessários, não se nega. Mas a falta de medida visando apenas a geração de mais e mais lucro é evidente.
Adriano, por exemplo, virou ídolo porque é um craque do futebol, faz muitos gols e, quando em forma, é capaz de jogadas extraordinárias. Em 2009, fez metade dos gols do Flamengo na campanha do Hexa. Mas fazer muitos gols é motivo suficiente para que Adriano seja um exemplo de vida a ser seguido? Obviamente que não, mas a mídia não faz essa diferenciação propositalmente, pois sabe que a exploração da imagem do jogador também fora de campo vende muito mais e gera muito mais lucro. A cobertura apenas esportiva não é suficiente.
Enfim, vive-se o tempo da pressa. Há pressa para construir novos ídolos, novas celebridades, novas fontes de lucro. Da mesma forma, há a mesma pressa para se destruir os mesmos ídolos, uma pressa alimentada pelo “voyerismo” do grande público que, como numa grande novela, exige mocinhos e vilões novos a cada dia.

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